Com contratação pela CLT, Future-se vai atender o mercado e comprometer o ensino
PACTU
Em meio aos cortes de verbas e protestos de estudantes e trabalhadores e trabalhadoras para defender a educação pública e de qualidade, em julho deste ano, o governo de Jair Bolsonaro (PSL) e seu ministro da Educação, Abraham Weintraub, apresentaram o Future-se.
Segundo o governo, a medida visa modernizar as 63 universidades federais do país, criar alternativa para a crise orçamentária das instituições e diminuir “gastos” com folha de pagamento.
Trabalhadores da Educação rebatem este argumento e afirmam que o objetivo não é bem este. Para professores, sindicalistas e técnicos entrevistados pelo Portal CUT, a medida vai atender o mercado e compromete o ensino público, gratuito e de qualidade.
Ainda sem data para ser apresentada e avaliada pelo Congresso Nacional, a proposta privatista do Future-se vai ficando cada vez mais clara a cada novo anúncio do governo. Em matéria publicada nesta semana pela Folha de S. Paulo, o ministro afirmou que as faculdades e universidades que aderirem ao Future-se vão ter de passar a contratar docentes e administrativos via CLT, ou seja, com carteira assinada pelas Organizações Sociais (OS) e não mais via concurso público.
“Este governo trata a educação como mercadoria e para aumentar a lucratividade quer tirar direitos conquistados pelos educadores universitários a partir de sua contratação. Nós entendemos que este processo via CLT e a partir de OS ferem os direitos conquistados e é inconstitucional”, afirmou o professor e secretário de Cultura da CUT, José Celestino Lourenço, o Tino.
Para Tino a modernidade não pode ser confundida com projeto político de um governo. Segundo ele, as contratações pelas OS’s - entidades privadas que prestam serviços públicos e não precisam seguir a lei de Licitações e Concursos - significa que a autonomia universitária em lei deixa de existir e abre caminho para a privatização e a terceirização.
E ainda, continua o dirigente CUTista, vão inserir um processo ideológico, com uma educação fundamentalista que altera a construção coletiva e democrática da educação em todos os seus processos.
Para o presidente da Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico (Proifes), Nilton Brandão, este governo quer destruir a carreira dos docentes construída há anos com professores e pesquisadores com dedicação exclusiva para servir à nação e não para um governo.
“Contratar via CLT é dizer que vai contratar pessoas que o mercado precisa e não necessariamente que o ensino, pesquisa e extensão precisam. Com isso a educação vai ser colocada na prateleira pra ser comprada no mercado”, afirmou.
Estabilidade
O ministro da Educação argumenta que mesmo CLT, os trabalhadores das universidades federais contratados no Future-se terão estabilidade, assim como concursados.
Brandão diz que o governo e seu ministro mentem descaradamente quando se trata de educação, porque CLT pode ser mandado embora e, além disso, segundo ele, o governo mostra o tempo todo a vontade de demitir servidores.
“Este governo tem tentado redefinir conceitos para a sociedade fora da realidade e sem nenhum fundamento e, além disso, me parece um pouco contraditório. Não sei como eles podem garantir estabilidade para CLT e ao mesmo tempo apresentar uma proposta para acabar com a estabilidade de servidores públicos”, disse.
Contratação x qualidade
Para o Secretário de Assuntos Jurídicos do Proifes, Eduardo Rolim, o serviço público tem que ser profissional, ter a melhor qualificação possível e com estabilidade. Segundo ele, o concurso público é o sistema de contratação que se baseia na qualificação e no princípio da República.
“A Proifes não vê nenhum cabimento contratar via CLT porque pode ter desqualificação do serviço com apadrinhados e as universidades são do Estado e tem autonomia e não pode estar à mercê do governo de plantão”, afirmou.
Derrota do governo?
O coordenador-geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra), José Maria, disse que o governo já começa a sentir a derrota do Future-se quando 24 universidades já disseram ser contrárias ao programa e 16 estão em discussão.
“O projeto inteiro é um fiasco, mas quando a gente concentra sobre a questão da contratação via OS é um absurdo. O concurso público é fundamental para uma função que precisa do compromisso com o povo brasileiro e não com o governo. Só com concurso garantimos uma forma democrática de contratação e também de qualidade de ensino, diferente do que quer este governo que parece que quer a volta do apadrinhamento, de preferência ideológico”, afirmou.
Segundo José Maria, a Fasubra está esperando há nove meses uma conversa com o governo “e eles fingem que a gente não existe e nem por isso deixamos de analisar o Future-se. O resultado do debate entre técnicos, docentes e estudantes se deu quando 24 conselhos universitários chegaram à conclusão de que o projeto nada vai trazer de melhoria nem para os estudantes, nem para os professores e nem para o Brasil”.
Desconhecimento da educação universitária brasileira
O ministro da Educação, também na matéria da Folha, disse que as universidades brasileiras não estão bem ranqueadas devido à distribuição de verbas sem controle algum.
“O ministro não conhece a educação brasileira, parece que ele caiu de paraquedas de outro planeta e não sabe que a nossa educação universitária é altamente qualificada”, disse o presidente da Proifes, Nilton Brandão.
Segundo ele, todas as pesquisas mostram que as universidades brasileiras são comparáveis a instituições internacionais e os números mostram isso. 98% da pesquisa brasileira são produzidas por estas universidades e negar este retorno social é negar a realidade brasileira.
“É mais uma mentira deste governo”, critica Brandão.
Retaliação
Para Rolim, as universidades que não aderirem ao programa podem sofrer retaliação do governo, que já disse que nenhuma universidade é obrigada a aderir, mas também afirmou que não terá nenhum recurso garantido.
“Vai ter pressão quase que impossível para as universidades aderirem. Tenho certeza que seremos retaliados, porque ou aceitamos o orçamento via OS ou vamos morrer a míngua sem recursos. Só o Congresso poderá rejeitar esta proposta nefasta”, concluiu.
Bomba relógio
Na matéria da Folha o ministro da Educação Abraham Weintraub também fala sobre cortar “gastos” com folha de pagamento, que é vista como bomba relógio.
“Bomba relógio é atrasar a pesquisa e ciência e tratar a educação com custo e não como investimento, porque é o acolhimento das novas gerações e as novas tecnologias que vão gerar riquezas para o país”, acrescenta Brandão.
Mobilização
Desde o início do ano, quando começaram os ataques contra a educação, os trabalhadores e estudantes não deixaram às ruas em protesto contra este governo. Nos próximos dias 02 e 03 de outubro haverá mobilizações nacionais em defesa da educação pública e de qualidade e contra a reforma da Previdência, que está tramitando no Senado.
“Nós somos uma federação e cada sindicato é autônomo e vai fazer o que quiser, mas o que importa é que todos participaram do processo de mobilização”, disse Rolim.
Para Brandão, “vamos derrubar o projeto no congresso, seja ele qual for, porque temos uma mobilização muito forte e o povo tem conhecimento que a educação pública é um patrimônio brasileiro”.
Segundo Tino, a CUT entende que este processo faz parte de uma estratégia antiga do capital que trata a educação como mercadoria e a Central estará na luta pela educação pública e de qualidade sempre que necessário.
“A CUT faz parte do Fórum Nacional Popular pela Educação (FNPE) e será parte das mobilizações em outubro. E no dia 02 estaremos realizando um grande ato em Brasília em defesa da educação pública e soberania nacional”, afirmou.
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