Sem controle da pandemia, Brasil se torna ameaça mundial

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Sem controle da pandemia, Brasil se torna ameaça mundial
Pedestres na praça Internacional, área fronteiriça entre Santana do Livramento (Brasil) e Rivera (Uruguai), em 19 de março. Foto: Diego Vara/Reuters

Países vizinhos adotam medidas para reduzir o tráfego de pessoas nas fronteiras e se protegerem da variante brasileira do coronavírus

Naiara Galarraga Gortázar

pandemia de coronavírus está descontrolada no Brasil, que ultrapassou a marca de 300.000 óbitos acumulados na quarta e registrou o pico, até agora, de 3.251 mortes em um só dia na terça. Cada 100 brasileiros infectados com a covid-19 agora espalham a doença para outras 123 pessoas, de acordo com dados do Imperial College de Londres citados no principal noticiário da noite. A transmissão intensa —acelerada pela variante brasileira, mais contagiosa— causou uma avalanche de pacientes em estado grave que tem levado as UTIs ao colapso em boa parte do território. E os cientistas temem que o Brasil esteja se tornando uma incubadora de novas variantes e cepas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) exige firmeza do Governo federal e coordenação com o Congresso e o poder judiciário enquanto os países vizinhos tomam medidas para se proteger, como suspender voos ou tentar levantar uma barreira epidemiológica.

A Organização Pan-Americana de Saúde, braço regional da OMS, alertou nesta semana por meio de sua presidenta, Carissa Etienne, que o coronavírus avança “perigosamente” no Brasil, epicentro da pandemia no mundo. “Infelizmente, a grave situação do Brasil está afetando os países vizinhos”, destacou, citando o aumento dos casos nas regiões fronteiriças da Venezuela, Peru e Bolívia. O gigante sul-americano faz fronteira com outros sete países. Quase todos eles registram aumento de casos por milhão, segundo a contagem do site Our World in Data.

Três Estados brasileiros (Acre, Rondônia e Rio Grande do Sul) não possuem um único leito livre de UTI. E mais da metade tem 90% dos lugares ocupados por causa da avalanche de pacientes nas últimas semanas. As perspectivas não dão sinais de melhora no curto prazo. Margareth Dalcomo, médica da Fiocruz, alerta em declarações ao jornal O Globo que “abril pode ser ainda pior que março” no Brasil. O motivo é um coquetel de fatores: “A alta taxa de transmissão, o número de casos entre os mais jovens, a lenta taxa de vacinação por falta de vacinas, a mortalidade, o esgotamento dos profissionais da saúde e, o mais triste, pelo número de mortos”. Só agora, após um ano da pandemia, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a criação de um comitê de crise, sob pressão do Congresso e de economistas.

Com 210 milhões de habitantes, tem uma taxa acumulada por milhão que atualmente o situa atrás dos Estados Unidos e da Espanha, mas as distâncias estão diminuindo a toda velocidade. E os novos contágios diários estão armando uma bomba-relógio —já são mais de 12 milhões de infectados desde o início da pandemia.

O virologista José Eduardo Levi explica à revista Veja: “As mutações podem ocorrer em qualquer lugar, mas, quando não há condições favoráveis para sua proliferação, desaparecem. Infelizmente, este não é o caso do Brasil”. O vírus circula rapidamente entre os brasileiros porque parte da população, inclusive o presidente Bolsonaro, não mantém as medidas básicas de isolamento social e uso de máscara, o que permite ao vírus transitar livremente e dar origem a novas variantes.

Vários países vizinhos já detectaram em seus territórios a variante brasileira, que tem esse nome porque o Japão a identificou em um viajante que chegava de Manaus, e adotaram medidas para se protegerem. A P1 é mais contagiosa do que a cepa original e ataca os jovens com maior virulência. Para piorar a situação, algumas pessoas que já haviam tido coronavírus se reinfectaram.

Na Venezuela, os contágios diários aumentaram para o dobro desde meados deste mês. E isso considerando que há uma subnotificação notável em razão da limitada capacidade do país de fazer diagnósticos. Com o Brasil transformado em ameaça, é o vizinho que tomou as medidas mais contundentes. Nesta semana o Governo decretou o confinamento em toda a Venezuela, de modo que só os trabalhadores essenciais do setor de saúde e alimentação podem sair ir às ruas. A medida foi implementada três semanas depois que a variante brasileira foi detectada em três Estados da fronteira.

presidente Nicolás Maduro, que chegou a acusar o Brasil e a Colômbia de enviarem infectados a seu país para propagar deliberadamente a doença, culpa Bolsonaro, “um irresponsável”, por causar esta segunda onda. E alertou os venezuelanos: “Temos fronteira com eles e essa variante chegou. Tudo depende de vocês... têm que se cuidar”. As autoridades também reabriram abrigos para quarentenas e reativaram as rondas de casa em casa para detectar contagiados.

Colômbia e Peru suspenderam os voos com o Brasil como medida de precaução. Os peruanos só permitem o fretamento de voos humanitários para repatriar cidadãos. Os outros, nem isso.

As autoridades colombianas também cancelaram a conexão aérea interna com Letícia, principal cidade amazônica do país. E, para erguer uma espécie de muro epidemiológico contra a nova variante, também anteciparam a vacinação em vários departamentos amazônicos —em áreas de floresta e escassamente povoados—, com o envio de 40.000 doses do imunizante Coronavac (da chinesa Sinovac, que no Brasil é desenvolvido em parceria com o Instituto Butantã). Pretendem conter assim a propagação para o resto do país. As autoridades sanitárias não confirmaram até o momento a presença da variante brasileira em seu território, apesar de especulações de prefeitos como os de Bogotá e Medellín.

O Chile, que não tem fronteira com o Brasil, mantém voos com o país e outros destinos, mas com uma contrapartida. Os recém-chegados de avião, especialmente os do Brasil, devem permanecer em quarentena por 72 horas em um hotel de trânsito, mesmo que tenham um PCR negativo recente. Se o resultado do teste dar negativo novamente, terão que cumprir 10 dias de quarentena obrigatória em seu endereço residencial. Os custos extras ficam por conta do viajante.

A Argentina eliminou parte dos voos para o exterior, não só os do Brasil. Vai começar a pedir PCRs dos turistas e avalia adotar a medida de impor a quem der positivo uma quarentena em um hotel, pago de seu bolso. O Governo estuda novas ações para conter os contágios, mas vai anunciá-las no fim de semana para não esfriar a cúpula do Mercosul marcada para esta sexta-feira, em formato virtual.

Está confirmada a entrada da variante de Manaus no Peru. E sabe-se que foi por Caballococha, na tríplice fronteira com o Brasil e a Colômbia. As autoridades sanitárias atribuíram a velocidade de transmissão às variantes brasileira e sul-africana.

As autoridades uruguaias fecharam os serviços públicos e suspenderam as aulas presenciais nas escolas. E o Paraguai, que estuda decretar a quarentena nacional por ocasião da Semana Santa, confirmou nesta quarta-feira os dois primeiros casos de infecção pela variante brasileira. O ministro da Saúde do Paraguai, Julio Borba, alertou que a transmissão já é comunitária porque um dos infectados “é um jovem que nunca viajou e se dedicada a tarefas domésticas”.

Com informações de Florantonia Singer (Caracas), Santiago Torrado (Bogotá), Rocío Montes (Santiago), Federico Rivas Molina (Buenos Aires), Jaqueline Fowks (Lima), Santi Carnieri (Assunção).

Fonte: El Pais Brasil

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