Saques antecipados do FGTS colocam em risco investimentos e criação de empregos
PACTU
Governo quer liberar mais saques do FGTS para estimular economia. Decisão impede investimentos em infraestrutura e construção de casas, fatores geradores de empregos, diz economista do Dieese
Sem ter um programa concreto de geração de emprego e renda para diminuir a crise social e sanitária agravada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19), a equipe econômica do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) quer mais uma vez utilizar dinheiro do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), que pertence ao trabalhador para estimular o consumo. O problema é que o trabalhador gasta o dinheiro hoje, mas quando ficar desempregado não terá os recursos do fundo para ajudar a sobreviver. Além disso, esse tipo de medida reduz os recursos para o financiamento da casa própria e de obras de infraestrutura.
Apesar disso, pela segunda vez, o governo quer liberar uma parte do FGTS, como foi feito no ano passado, quando criou o saque- aniversário e o saque emergencial que autorizou 51 milhões de pessoas a sacar uma parcela do seu saldo individual.
O que parece ser uma boa medida porque tem apelo popular, no entanto, pode impedir os financiamentos da casa própria feitos com recursos do FGTS e das obras em infraestrutura, especialmente em saneamento, alerta o economista do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) Clovis Scherer, e assessor da CUT na bancada do Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat).
“Há uma grande preocupação com o novo saque por que de fato já há uma saída de recursos muito grande, em virtude das demissões que ocorreram durante a pandemia. Além disso, 9 milhões de trabalhadores optaram pelo saque-aniversário em que a cada ano podem retirar uma parte do seu saldo no mês de seu aniversário. Isto tem trazido perdas ao Fundo”, diz Scherer.
Saques extraordinários colocam dinheiro na mão de quem tem emprego
Para o economista, os saques extraordinários vão colocar dinheiro na mão de quem tem emprego e renda e retira das aplicações, que financiam habitação popular e geram empregos. Isso sem contar que quando mais precisar, na hora do desemprego, o trabalhador terá pouquíssimos recursos em sua conta.
De acordo com Scherer, a própria Caixa Econômica Federal (CEF) demonstrou que os saques de R$ 1.045 autorizados anteriormente beneficiaram, principalmente, pessoas que tinham emprego, não os desempregados.
“60% de quem recebeu tinha um valor maior do que mil reais na sua conta vinculada. Eram pessoas que tinham contas maiores, de R$ 40 mil a R$ 100 mil no Fundo, então tinham bons salários. Quem tem emprego e saca geralmente vai colocar o valor em outro banco, para investimento, só que deixa a descoberto investimentos que geram mais benefícios à sociedade, como obras de habitação e saneamento básico”, diz o economista.
Segundo ele, depois de anos sem prejuízos, em 2019, sob o governo Bolsonaro, o FGTS registrou perda líquida de R$ 34 bilhões, e embora o balanço de 2020 ainda não tenha sido divulgado, a expectativa é de que as perdas somem mais R$ 2,1 bilhões.
“No ano passado ainda tivemos a entrada de R$ 22 bilhões que foi o dinheiro do PIS/PASEP que estava parado, sem que o trabalhador que tinha direito a saque tivesse ido buscá-lo. Deixar no FGTS é uma forma indireta do trabalhador receber o que tem direito”, afirma o assessor da CUT no Codefat.
Embora o pedido de liberação de novos saques emergenciais não tenha chegado oficialmente ao Conselho, o economista diz que, dependendo do montante a ser autorizado, a liberação representará a saída de recursos expressivos, pois para honrar esses pagamentos o FGTS terá de vender seus títulos e buscar outras formas de financiamento.
“O FGTS não tem recursos guardados no cofre. Na verdade, esses recursos foram usados para financiar empréstimos da casa própria para o trabalhador e o Fundo não pode antecipar essa cobrança. O mesmo em relação aos investimentos feitos em obras de infraestrutura”, conta.
O economista explica ainda que parte do dinheiro arrecadado pelo Fundo está aplicado em títulos públicos, e se o FGTS tiver de se desfazer desses investimentos vai perder dinheiro.
“Os recursos não estão parados, estão aplicados. Se desfazer antecipadamente dessas aplicações, que são de longo prazo, de muitos anos, é perder dinheiro, e no final, o próprio trabalhador será prejudicado porque são os dividendos dessas aplicações que possibilitam o FGTS pagar rentabilidade anual de 3% e mais um percentual que cai a cada mês na conta individual de cada trabalhador”, afirma Scherer.
Outro fator prejudicial aos recursos do Fundo de Garantia é o adiamento nos depósitos por quatro meses que as empresas podem fazer, autorizado pelo governo. Para o economista, embora esse dinheiro possa ser recuperado mais adiante provoca um rombo momentâneo nas contas do FGTS.
"A melhor coisa é emprestar os recursos do FGTS para investimentos na habitação. São esses recursos que movimentam a economia e geram empregos. O saque emergencial é uma medida populista do governo"- Clovis Scherer
Como funciona o Codefat
O Codefat é formado por 18 conselheiros, sendo seis representantes de cada grupo (trabalhadores, empresários e governo). Para um projeto ser aprovado é preciso o voto de 10 conselheiros. Em caso de empate o voto que decide é do presidente. Hoje o cargo é ocupado pelo representante da UGT, Canindé Pegado.
*Edição: Marize Muniz
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