Para Roberto Amaral, governo Bolsonaro pode instaurar novo regime no país
PACTU
Ex-presidente do PSB diz que é um erro apostar no "desastre" da nova gestão. Segundo analista do Diap, presidente não tem votos suficientes para aprovar reformas constitucionais no Congresso, como no caso da Previdência, e terá que saber negociar.
São Paulo – A posse do presidente Jair Bolsonaro não marca simplesmente uma transição de governo. Com ela, começa a se instalar um novo regime no país, na opinião do cientista político Roberto Amaral, ex-presidente do PSB. "Esse governo representa a transição do autoritarismo para o totalitarismo. Isso pode ser feito, como já foi inúmeras vezes, e inclusive com cobertura legal. O que ele precisar modificar, modifica no Congresso – que está aí para isso – e o que precisar legitimar, o Judiciário legitimará, porque também está aí para isso."
Ele lembra que "a experiência" Bolsonaro tem apoio internacional e também "das circunstâncias internacionais, com o avanço da direita". E acrescenta que o novo governo tem ainda o apoio específico dos Estados Unidos, que, além de sua influência tradicional sobre o Brasil, agora é governado pelo governo de direita de Donald Trump.
“Além disso, há a aliança com o pentecostalismo mais primitivo e o judaísmo de direita representado por Israel, costurada com a promessa da transferência da embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém.” E também. Para Amaral, há outro fator a ser considerado. "O que mais assusta não é nem o Bolsonaro, que é uma consequência, mas o fato de ele ter apoio na sociedade, que reproduz o que ele pensa."
Em sua opinião, não se pode sequer arriscar a prever quanto tempo durará a "experiência" Bolsonaro. "Ninguém sabe. Quando o golpe de 64 se instaurou, ele próprio foi projetado para um ou dois anos, com a convocação de eleições em 65, e foi até 84. Quando Hitler se instalou, não se pensava que iria de 1930 a 1945 e só cairia com a derrota na Guerra."
O ex-presidente do PSB avalia que, pelo menos no momento, não se pode dizer que há uma resistência importante ao governo. "Há um sentimento de resistência, mas não apareceram ainda formas organizativas.Talvez seja cedo, mas não apareceram. Do meu ponto de vista, no momento, nenhum dos partidos atuais, incluindo PT e PCdoB, tem condições dessa organização. Esse regime se instaura num momento de fragilidade do movimento sindical e do movimento social”, diz.
Para Amaral, Bolsonaro “tem todas as condições objetivas de se firmar e, além do mais, as condições econômicas do país são mais favoráveis do que em 2015, com inflação em queda e recessão em queda.” Por isso, ele avalia que é um erro apostar no “desastre” desse governo. “Eu não aposto nisso", afirma.
No Congresso
Para o analista Alysson de Sá Alves, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), do ponto de vista das relações do governo Bolsonaro com o Congresso Nacional, o novo presidente pode vir a ter dificuldade em aprovar emendas constitucionais, que exigem 308 votos na Câmara e 49 no Senado, em duas votações em cada uma das casas.
"Se Bolsonaro não sabe negociar, precisará se cercar de pessoas com capacidade para isso. Onyx Lorenzoni tem larga experiência parlamentar. Ele é responsável pela interlocução com o Congresso", diz.
Nesta quarta-feira (2), em discurso na cerimônia de transmissão de cargo no Palácio do Planalto, Lorenzoni garantiu que o governo vai mostrar "capacidade de dialogar" e declarou ser necessário "um pacto político entre governo e oposição por amor ao Brasil". Ele ocupa a pasta que era de Eliseu Padiilha.
Lorenzoni fez um discurso conciliador e chegou a dizer que "não recebemos um papel em branco ao vencermos as eleições".
Segundo o Diap, Bolsonaro terá "apoio consistente" de 255 deputados e apoio "condicionado" – que depende do conteúdo das reformas – de 117 parlamentares na Câmara. Esse grupo de 255 deputados é formado por congressistas do PSL, PP, PR, DEM, PSD, PTB, PRB, Podemos, PSC, PHS, PRB e DC.
Nessas condições, o chefe do Executivo teria que somar mais 53 parlamentares para chegar aos 308 para aprovar uma proposta de emenda à Constituição, que é o caso da reforma da Previdência. "Porém, mesmo no caso dos apoios consistentes, alguns parlamentares também podem se preocupar com suas bases", avalia Alves.
O próprio Bolsonaro, nos discursos de posse, prometeu prestigiar o Congresso. "Vamos valorizar o Parlamento, resgatando a legitimidade e a credibilidade do Congresso Nacional", disse.
Ele tende a negociar diretamente não com os partidos, mas com as bancadas informais, tais como a ruralista e a evangélica. "Esse é um problema para ele, porque essas bancadas agregam parlamentares de inúmeros partidos, das mais variadas ideologias. Além disso, não são as bancadas informais que definem os líderes partidários, os indicados para disputar as presidências das comissões ou que definem os relatores de matérias de projetos do governo", explica o analista do Diap. "E o mandato não pertence ao deputado, mas ao partido."
Segundo os cálculos do Diap, com 141 parlamentares, a oposição "será muito aguerrida e forte, e não dará trégua ao governo". PT, PCdoB e Psol não participaram da posse do novo presidente.
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