Armar a população é inconstitucional e mergulhará o país num 'faroeste'

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Armar a população é inconstitucional e mergulhará o país num 'faroeste'
"Cidadãos de bem" poderão ter até quatro armas dentro de casa, de acordo com novo decreto

Deputados federais do campo progressista fizeram, na tarde de hoje (15), duras críticas ao decreto do presidente da República, Jair Bolsonaro, que facilita a posse de armas pela população. Em entrevista coletiva, o deputado Paulo Pimenta (RS), líder do PT na Câmara, alertou: "Isto mergulhará o país num caos, numa espécie de faroeste onde aqueles que têm dinheiro poderão adquirir grandes quantidades de armas e munição, e as pessoas de menor poder aquisitivo serão vítimas não só de grupos armados, mas também de grupos econômicos".

Ele afirmou que o decreto é construído com grande " carga de subjetividade" . O texto prevê, por exemplo, que cada pessoa terá direito de adquirir até quatro armas de fogo, abrindo a possibilidade para a aquisição de " quantidade superior a esse limite (...) se presentes outros fatos e circunstâncias que a justifiquem" . " Imagina uma casa com três adultos, com 12 armas. São pistolas, armas de grosso calibre, fuzis de repetição"

Durante a coletiva, Pimenta questionou se a liberação para a comercialização de armas no país tem real eficácia para que a população passe a ter a sensação de estar segura. " Como vamos nos sentir cada vez que nossos filhos saírem de casa?"  

O PT entrará com uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF). O PT e o Psol apresentarão propostas de decretos legislativos para sustar os efeitos do texto de Bolsonaro. 

O deputado federal Ivan Valente (Psol-SP) considera viável a suspensão do decreto que será proposta pelos partidos. "Trata-se de uma violação constitucional. Eles flexibilizaram totalmente o Estatuto do Desarmamento, que é uma lei, através de um decreto." Para ele, a medida anunciada por Bolsonaro se deu " exorbitando o poder Executivo e violando as funções do Legislativo" .

O deputado Wadih Damous (PT-RJ), segundo o site do PT, afirmou que " o decreto é de duvidosa constitucionalidade e empurra o Brasil mais um degrau abaixo do processo civilizatório" . Acrescentou: " Bolsonaro vai transformar o País em um sangrento faroeste" .

Os parlamentares são unânimes em afirmar que o Estatuto do Desarmamento não poderia ter sido modificado por decreto, mas apenas por lei.

Ivan Valente observa que a reação ao decreto de Bolsonaro está sendo " bastante forte na sociedade civil e até na grande imprensa" . Em editorial publicado na tarde de hoje, o jornal O Globo anotou: "Difícil desmentir a relação entre mais armas e mais mortes" .

Na opinião de Valente, a intenção, com a flexibilização, é " substituir o papel do Estado na segurança pública" . Ele destaca também que " quanto mais armas em circulação, mais armas na mão dos delinquentes" . Ele cita estudo do Instituto Sou da Paz segundo o qual cada arma colocada em circulação pode dobrar o número de homicídios.

Também para Guaracy Mingardi, ex-secretário para Assuntos de Segurança Pública na gestão de Elói Pietá (PT) em Guarulhos, a liberação da posse, da maneira como prevê o decreto, significa colocar, no médio e longo prazo, mais armamento na mão de criminosos. " Eles se abastecem assim. Armas na mão dos chamados cidadãos de bem são roubadas e acabam na mão do criminoso."

Na opinião de Mingardi, um dos motivos para a queda dos homicídios em São Paulo foi que a campanha do desarmamento (a partir de 2004) retirou 105 mil armas das ruas. 

Além disso, em sua opinião, boa parte dos homicídios não tem nada a ver com o criminoso profissional, mas decorre de brigas de bar e trânsito, por exemplo. " Eu sempre digo: quanto mais frouxo o cara é, mais interesse ele tem em andar armado" , diz o ex-secretário.

No editorial, o jornal da família Marinho observou ainda: "O Estatuto do Desarmamento, ao entrar em vigor em 2004, estancou o ritmo de crescimento de homicídios — de 8,1% ao ano entre 1980 e 2003, para 2,2% de 2004 a 2014. Agora, resta ao Legislativo e a organismos da sociedade civil acompanharem a implementação do decreto" .

Em junho passado, o Atlas da Violência 2018, estudo elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a partir de dados do Ministério da Saúde, mostrou que São Paulo registrou a maior queda na taxa homicídios, de 2006 a 2016, de 46,7%.

Direito?

No discurso em que defende a medida, Bolsonaro afirmou que ela "nada mais é do que restabelecer um direito deferido nas urnas por ocasião do Referendo de 2005, onde, infelizmente, o governo à época buscou maneira em decretos e portarias a negar-lhes esse direito".

Naquele ano, 63% dos eleitores rejeitaram, em referendo, a proibição do comércio de armas de fogo e munição no Brasil. "O povo decidiu por comprar armas e munições e nós não podemos negar o que o povo quis naquele momento", disse ainda o presidente.

"Qualquer pessoa que tenha noção básica sobre segurança pública, em qualquer lugar do mundo, sabe que isso não tem por objetivo atender ao justo sentimento da sociedade por paz, tranquilidade e segurança, mas atender o lobby da indústria de armas", declarou Paulo Pimenta.

Fonte: Rede Brasil Atual

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