Depois do carnaval, vem o bloco do Imposto de Renda. Com perdas
PACTU
Declarações podem ser feitas a partir do dia 2. Bolsonaro disse que ia corrigir a tabela. Já são cinco anos sem correção. Para o Sindifisco, 10 milhões de pessoas não deveriam estar declarando
São Paulo – Passado o carnaval, se aproxima o período da declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). O prazo para declarar começa na próxima segunda-feira (2) e vai até 30 de abril, com restituição a partir de maio – serão cinco lotes em vez de sete. Mais uma vez, não haverá correção na tabela de alíquotas, o que na prática significa mais gente caindo nas garras do Leão – a última vez que a tabela foi corrigida foi em 2015. Antes, foram 11 anos consecutivos com reajustes. Do impeachment, em 2016, em diante, não houve mais correção.
A Receita Federal espera receber 32 milhões de declarações, ante 30,7 milhões no ano passado. O download para este ano já está disponível no site da Receita. Entre outros, devem declarar aqueles que receberam rendimentos tributáveis acima de R$ 28.559,70.
O Imposto de Renda está prestes a se tornar centenário no Brasil. No primeiro ano de cobrança, em 1924, foram entregues 82.594 declarações, de acordo com o estudo História do Imposto de Renda no Brasil, um enfoque da pessoa física (1922-2013).
Em maio do ano passado, em entrevista à Rádio Bandeirantes, Jair Bolsonaro disse que a correção sairia. “Falei para o Paulo Guedes que, no mínimo, este ano temos que corrigir de acordo com a inflação a tabela para o ano que vem. E, se for possível, ampliar o limite de desconto com educação, saúde. Isso é orientação que eu dei para ele. Espero que ele cumpra, que orientação não é ordem. Mas, pelo menos, corrigir o Imposto de Renda pela inflação, isso, com toda a certeza, vai sair”, declarou. Não saiu.
Defasagem acima de 100%
De acordo com o Dieese, que elaborou nota técnica sobre o tema, desde 1996 o país tem uma defasagem superior a 100% na tabela do IRPF. É o que também aponta o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), que acompanha sistematicamente o assunto. (Confira tabela no final do texto.)
Não houve correção de 1996 a 2001, em 2003 e 2004 e de 2016 para cá. Em 25 anos, a tabela foi reajustada em 13 e ficou intacta em 12. Dos oito anos de governo Lula, houve correção em seis – em quatro, acima da inflação. Isso aconteceu também nos quatro anos do primeiro governo Dilma e no primeiro ano do segundo governo, que teve o impeachment em 2016.
Pela tabela atual, quem ganha até R$ 1.903,98 não paga Imposto de Renda. Se a correção tivesse sido aplicada na íntegra, o limite de isenção teria aumentado para R$ 3.882,98, mais que o dobro.
10 milhões não deveriam declarar
O presidente do Sindifisco Nacional, Kleber Cabral, estima que, sem correção, pelo menos 10 milhões de pessoas estão declarando imposto indevidamente – praticamente um terço do total.
“É como uma bola de neve que vai pesando cada vez mais. É uma maneira oblíqua de aumentar a arrecadação sem lei, uma maneira fácil de arrecadar sobre uma parcela da população que não tem muito como se defender”, afirma.
Ao ignorar a correção pela inflação, o que se acumula a cada ano, muitos que eram isentos passam a contribuir e quem já está na lista acaba pagando proporcionalmente cada vez mais.
O problema, avalia o auditor, não é tanto a quantidade de alíquotas. “É que você chega muito rapidamente ao topo”, diz. O presidente do Sindifisco lembra que em 1996 quem recebia até nove salários mínimos não pagava. “Hoje, com dois você paga. E com cinco já está no topo.”
A não-correção aumenta a carga tributária e prejudica mais o contribuinte de menor renda, ressalta o sindicato dos fiscais da Receita, que defende o reajuste pela inflação para a tabela, das parcelas a deduzir e as demais deduções por dependente – para o Sindifisco, o desconto por dependente, hoje em R$ 2.275 ao ano, deveria estar em R$ 4.646,40 – em valores mensais, R$ 189,59 e R$ 387,20, respectivamente. A regressividade na tributação, assinala a entidade, é um “indutor das desigualdades sociais”.
A regressividade beneficia os mais ricos, observa o presidente do Sindifisco Nacional, defendendo a alternativa oposta. Por progressividade, entende-se fazer uma adequação da alíquota à capacidade de contribuição: em outras palavras, o que tiver menos renda também deve pagar menos.
Os vários anos sem correção, além de aumentar a defasagem, tornam-se uma dificuldade adicional para resolver o problema: não seria possível fazer o reajuste de uma só vez, porque isso traria uma brutal queda de arrecadação. “Vai demandar alguns anos, talvez uma década”, acredita Kleber Cabral. “Se houvesse a tributação sobre dividendos, você conseguiria compensar”, exemplifica. Ele vê com cautela o debate atual sobre reforma tributária, lembrando que até agora o que aconteceu foi uma sucessiva aprovação de “puxadinhos”.
Mais faixas
O Dieese lembra que no final de 2006 houve acordo entre centrais sindicais e o governo para estabelecimento de uma política de valorização do salário mínimo. E ficou definido que de 2007 a 2010 haveria correção anual de 4,5% na tabela do Imposto de Renda, o que acabou sendo mantido até 2014. No ano seguinte, o reajuste médio foi de 5,6% – o último desde então.
Entre as propostas do instituto, está a inclusão de duas faixas tributáveis, com alíquotas de 30% e de 35%. Esta última seria para rendimentos mensais acima de R$ 17.063,86. “Deve-se ponderar que apenas a correção para atualização dos valores da tabela do IRPF não é suficiente para alterar a estrutura da contribuição e torná-la mais justa para os assalariados”, diz o Dieese.
De 1976 a 1978 chegou a haver 16 faixas e de 1983 a 1985, 13, com alíquota de até 60%. A atual estrutura, com cinco faixas, vem desde 2009.
Fonte: Receita Federal/IBGE. Elaboração: Sindifisco Nacional
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