Pode faltar profissionais da saúde se descaso do governo continuar, aponta estudo
PACTU
Pode faltar profissionais da saúde se nada for feito para mudar o cenário que o país está vivendo no setor. Está é a angustia de milhares de representantes de sindicatos, federações, confederações de trabalhadores do país e da Internacional de Serviços Públicos (ISP), entidade que representa 30 milhões de empregados no mundo, em 700 entidades e 154 países.
É isso o que revela uma pesquisa nacional, voluntária e digital, feita pela ISP no Brasil, integrada com a Campanha Internacional “Trabalhadoras e Trabalhadores Protegidos Salvam Vidas”. Os dados sobre a saúde e proteção dos trabalhadores e trabalhadoras da área nesta crise sanitária provocada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19) são preocupantes.
Que os casos confirmados e mortes pelo Covid-19 têm aumentado no Brasil as pessoas até sabem ou já ouviram dizer, mas o que talvez não saibam é que muitos contaminados são os próprios trabalhadores da saúde.
A falta de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), como máscaras, aventais e luvas, além das intensas jornadas de trabalho têm levado muitas trabalhadoras e trabalhadores da saúde a adoecerem, serem afastados e até mortos pela doença.
Sindicatos do mundo todo preocupados com a saúde, segurança e proteção dos profissionais de saúde têm cobrado respostas sobre esses problemas e recomendando algumas medidas urgentes para a categoria, como o afastamento de trabalhadores do grupo de risco, garantia de EPI, em quantidade e qualidade dentro dos protocolos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para todas e todos profissionais da saúde e treinamento e capacitação para o uso dos equipamentos necessários para não se contagiado.
O problema, segundo eles, é que os governos Federal, estaduais e municipais não têm sido tão transparentes nas informações tanto sobre os casos das mortes pela Covid-19 quanto pela falta de EPI, e muito menos sobre as testagens.
“As informações iniciais que nós temos é de que até o momento cerca de 25% dos profissionais da saúde de toda federação já estão afastados por conta do contágio da COVID-19. Em Pernambuco, por exemplo, um a cada três dos doentes de COVID-19 é trabalhador da saúde”, afirmou o presidente da CUT Rio de Janeiro e da Confederação Nacional dos Trabalhadores Seguridade Social (CNTSS), Sandro Alex de Oliveira Cezar, o Sandrão.
Os órgãos públicos e representantes de hospitais privados, em entrevistas coletivas, reportagens na mídia e até em respostas para as entidades sindicais, têm dito que já compraram os EPIs necessários, mas os profissionais de saúde alegam não estão chegando nos locais de trabalho.
Sandrão contou que o setor da saúde, ao longo dos anos, acumulou um déficit pessoal significativo, até mesmo porque as administrações públicas no último período, por políticas econômicas adotadas pelos governos que são altamente redutores do papel do estado, que pregam estado mínimo, vêm deixando de realizar concursos públicos pra repor a mão-de-obra que se aposenta. E que com a pandemia, segundo ele, piorou mais ainda.
“Com a Emenda Constitucional 95 de 2016, que limitou os investimentos na área por 20 anos, já tínhamos número insuficiente de profissionais de saúde para atender a população e com o aumento de trabalhadores e trabalhadoras ficando doente e se afastando pelo Covid-19 pode ficar ainda pior. Os trabalhadores não estão tendo acesso aos equipamentos de proteção individual com a qualidade e o país não tomou medidas anteriores a ocorrência da doença no país, o que fez agravar o caso”, explica Sandrão.
Ele sugere uma saída: “O caminho ideal seria reconversão das indústrias nacionais para que pudéssemos fabricar os Equipamentos de Proteção Individual (EPI), bem como os respiradores e mais equipamentos que serão necessários para prestação de serviço à sociedade. Mas não, o governo sub financia nosso Sistema Único de Saúde, que ainda assim vem demonstrando uma incrível capacidade de atender a nossa população”, finalizou o dirigente.
Resultado da pesquisa sobre condições de trabalho no combate ao coronavírus
A ideia da ISP em criar um diferencial da Campanha Internacional “Trabalhadoras e Trabalhadores Protegidos Salvam Vidas” com um questionário digital e de rápida resposta para que a trabalhadora ou trabalhador respondessem sobre suas condições de trabalho foi com objetivo de “aprimorar a obtenção de informações sobre a realidade do trabalho e desenvolver uma ação sindical a partir do retorno dos questionários respondidos”, explicou a secretária sub-regional do Brasil da ISP, Denise Motta Dau.
Segundo o balanço parcial do estudo, no qual 1021 formulários eletrônicos foram respondidos por profissionais de saúde e de serviços públicos, como as trabalhadores e trabalhadoras responsáveis pela distribuição de água, energia e gás, do sistema prisional, assistência social, de cemitérios, funerárias, educação e asseio e conservação e limpeza, entre os dias 02 e 12 de abril de 2020, 55% trabalhadores e trabalhadoras afirmam sofrer psicologicamente em função do momento em que estão vivendo no trabalho. E os outros dados da pesquisa acabam justificando este problema.
Das pessoas que responderam questionário, 37% estão trabalhando 8 horas por dia, 28% 6 horas, 25 % estão trabalhando todos os dias 12 horas e 10% estão trabalhando, diariamente, mais de 12 horas por dia no atendimento à população, sendo que a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é de que a jornada de trabalho em saúde seja de no máximo 6 horas diárias.
Em relação ao fornecimento de EPI, quando se questiona quais equipamentos estão chegando para os profissionais de saúde, a resposta é de que 67% diz ter luvas nos locais de trabalho, 51% dos trabalhadores e trabalhadoras disseram ter máscaras e 73% disseram ter álcool em gel. E 67% dos locais de trabalho informam que têm equipamentos de proteção individual, mas que eles não são suficientes para higienização conforme orienta a OMS.
“Isso significa que 33% dos profissionais estão trabalhando sem luvas, 49% sem máscara e 27% sem álcool em gel para atender a população e comprova que ainda tem uma boa necessidade de providenciar estes produtos básicos para os locais de trabalho”, afirma Denise.
Sobre o perfil do trabalhador ou trabalhadora que respondeu ao questionário, 77% são mulheres, 58% servidores e servidoras públicas, 33% são trabalhadores contratados por meio da CLT, 2% de terceirizados 3% de trabalhadores que não têm vínculo empregatício e 1% de residentes que estão fazendo residência nas diversas especialidades da área da saúde.
A profissão que teve maior participação no estudo foi o da enfermagem, seguido pelos técnicos de enfermagem e agentes comunitários de saúde. Os agentes de endemias, pessoal administrativo, assistente social, auxiliares de enfermagem, psicólogos e dentistas também responderam.
Campanha de proteção dos trabalhadores
A Campanha internacional “Trabalhadoras e Trabalhadores Protegidos Salvam Vidas” foi lançada no Brasil pela ISP no dia 31 de março deste ano e chegou para destacar a importância de todos e todas lembrarem que alguém que atua no setor sem as condições adequadas se arrisca e também põe a população em perigo.
A ideia é contribuir no enfrentamento dos impactos gerados pela pandemia de coronavírus na vida e na saúde de milhões de trabalhadoras e trabalhadores, que atuam nos serviços essenciais no país, que trabalham para sustentar as medidas de isolamento social e de cuidados de saúde à população.
Mais de 40 entidades sindicais estão junto na participação e no apoio nesta campanha porque estão preocupados com o que pode acontecer, caso nenhuma medida emergencial seja tomada para mudar o cenário em que estas categorias vivem.
“Acreditamos que de fato é necessário garantir a segurança dos trabalhadores e trabalhadoras da saúde para que eles possam atender melhor a população. Não é justo que quem trabalhe salvando vidas possa perder a sua vida em decorrência de um descaso dos patrões e dos governos para os quais trabalham”, afirma o presidente da CNTSS, uma das entidades filiadas a ISP e que participa da campanha.
Denise lembrou que a campanha é mundial e se baseia em convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tratam de segurança e saúde dos trabalhadores, acesso a serviços e atendimentos de saúde no trabalho, da promoção de saúde e segurança no trabalho, sobre os problemas de saúde mental decorrente do trabalho e dos perfis de ocupação profissional, que têm maior especificidade do ponto de vista de insalubridade e periculosidade.
Segundo ela, o ambiente de trabalho deve estar seguro e estável e isso não é uma responsabilidade individual de quem está trabalhando, seja no serviço de saúde ou nos demais serviços essenciais que precisam estar em funcionamento neste momento de enfrentamento a pandemia, “é uma responsabilidade dos gestores, do patrão e do empregador e não se trata somente de ter EPI e sim um ambiente seguro e saudável”.
“Se você está no ambiente de trabalho, com pacientes e macas dos corredores, pessoas desesperadas procurando atendimento e por mais que você tenha equipamento de proteção você continua no ambiente de trabalho insalubre e com periculosidade”, explica Denise.
Ela ainda ressalta que a campanha vai ajudar os sindicatos e representações destes trabalhadores a desenvolverem uma atuação mais fortalecida para superação dos problemas.
“É fundamental que neste momento a gente trate das condições de trabalho dos trabalhadores e trabalhadoras que estão à frente no combate ao coronavírus e a campanha pretende agregar, aglutinar e possibilitar que as entidades sindicais tenham uma atuação mais unificada e articulada em torno dessa pauta”, contou.
Deixar comentário