Defensores de privatização do Banco do Brasil e da Caixa ‘não têm visão de país’
PACTU
São Paulo – O presidente do Banco do Brasil (BB), Rubem Novais, voltou a defender, nesta segunda-feira (8), a privatização da instituição. Na famigerada reunião ministerial de 22 de abril, Novais e o ministro da Economia, Paulo Guedes, alegaram que não faria sentido manter dois bancos públicos, o BB e a Caixa Econômica Federal (CEF).
Para o economista Fernando Nogueira, a proposta de privatização das principais instituições financeiras do país é puramente ideológica e não tem viabilidade política, já que BB e a Caixa têm funções distintas e complementares. Trata-se, segundo ele, de uma desculpa utilizada pela equipe econômica do governo Bolsonaro pela “inação” diante do atual quadro de estagnação da economia.
“Não surpreende. Todos os prepostos do ministro são banqueiros da área privada. Não do varejo, mas de bancos de negócios. São pessoas acostumadas a comprar barato e vender caro. Não têm uma visão sistêmica. Muito menos uma visão de país, da história brasileira, e do papel dos bancos públicos”, criticou.
Nogueira é professor de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e foi vice-presidente de Finanças e Mercado de Capitais da Caixa. Ele também é autor dos livros Brasil dos Bancos (Edusp) e Bancos Públicos no Brasil (Fenae/FPA).
Segundo ele, o Banco do Brasil tem como função essencial operar o crédito agrícola, tanto para os pequenos produtores, como para o agronegócio. Já a Caixa tem como principal vocação o crédito imobiliário para a baixa renda.
Complementaridade
Os dois bancos públicos também não sofrem com a competição dos bancos privados, já que atuam em nichos de mercados distintos, explica. Os três grandes bancos privados do país – Bradesco, Itaú Unibanco e Santander – disputam clientes que estão na faixa dos 10% mais ricos da população, com renda média a partir de R$ 5.100. Já o BB e a Caixa, além das suas vocações principais, estão voltados para atender o restante da população.
“O papel dos bancos públicos é atender o povo brasileiro. Os 90% mais pobres, que não são o foco dos grandes bancos privados. Os bancos privados não estão interessados em fazer financiamento habitacional para aqueles que ganham até três salários mínimos, por exemplo. O Itaú vai fazer isso? O Santander, o Bradesco? Evidente que não”.
Nogueira também nega que os cinco grandes bancos do país – os dois públicos e os três privados – estejam ameaçados pelo avanço das chamadas fintechs, que utilizam a tecnologia para reduzir custos de operação. Esse foi outro argumento utilizado para defender a privatização de BB e CEF.
Segundo o especialista, são mais de 500 empresas desse tipo operando no Brasil atualmente, mas apenas 12 cumprem as três funções básicas de um banco: investimentos, crédito e pagamentos. Dos que atendem a esses critérios, a maioria opera com clientes com renda um pouco abaixo dos bancos tradicionais. E também não estão interessados na população com renda mais baixa.
Estabilidade
O regime de contratação no setor público também foi utilizado por Novais para justificar a privatização. Com participação minoritária do estado, o Banco do Brasil poderia contratar sem realizar concursos públicos. Principalmente, poderia demitir com mais facilidade. Outra vantagem, segundo a equipe econômica do governo, é que o banco fugiria da fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU). Na famosa reunião ministerial, ele se referiu ao órgão como uma “usina de terror”.
Para Nogueira, a estabilidade no serviço público é uma condição essencial para o funcionamento de qualquer instituição do estado. Trata-se de um mecanismo para impedir a perseguição ideológica aos funcionários. “A República exige. Para evitar o desmanche do estado a cada alternância de poder. Com isso, acaba a democracia.”
A facilidade na demissão, destaca o especialista, estimula a chamada “rotatividade“, prática usual no setor privado. O banco demite o funcionário que ganha mais, e troca por um novato, com salário menor. Com as funções primordiais dos bancos públicos são outras que não o lucro, não faria sentido aplicar essa lógica perversa.
Tarifas
Outro argumento utilizado pelos defensores da privatização dos bancos públicos é que eles, nem sempre, operariam com as menores taxas do mercado. Nogueira explica que é uma estratégia natural, pois Caixa e BB devem atuar para subsidiar as políticas sociais específicas de cada banco, como citado anteriormente. E devem, sim, buscar o lucro, competindo com os bancos privados, nas atividades que não forem essenciais. Justamente para contrabalançar as perdas nas funções primeiras.
Consequências
Os empresários do setor agrícola contam com facilidades junto ao BB para renegociar dívidas, em caso de quebra de safra, por exemplo. As condições não seriam as mesmas em um banco privado. Se o Banco do Brasil fosse privatizado, outra consequência direta, segundo Nogueira, seria a retirada dos fundos públicos operados pelo banco, que teriam de ser realocados para outra instituição pública para seguirem operando.
Todas esses aspectos apontam para a inviabilidade da proposta defendida pelo presidente da instituição e pelo ministro da Economia do governo Bolsonaro. “Se virar privado, teriam (por exemplo) que tirar o Fundo de Financiamento do Centro-Oeste (FCO), voltado ao crédito agrícola. O Banco do Brasil perderia essa função. A pergunta que faço é essa: a bancada ruralista que apoia esse governo vai apoiar a privatização do BB? Não tem a menor viabilidade política”, afirmou.
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