Consórcio que venceu leilão da Lotex desiste do negócio. Decisão abre possibilidade para Caixa voltar a operar a loteria instantânea

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Consórcio que venceu leilão da Lotex desiste do negócio. Decisão abre possibilidade para Caixa voltar a operar a loteria instantânea

Empresas exigiam que a Caixa cedesse a rede das lotéricas para vender os bilhetes. Acordo desejado pelos empresários seria a “morte” das próprias loterias, avaliou presidente da Fenae

As privatizações estão dando dor de cabeça para o governo. As empresas que venceram o leilão da Lotex, a italiana International Game Technology (IGT) e a americana Scientific Games International (SGI), informaram que não vão mais operar a loteria instantânea. As multinacionais queriam que a Caixa assinasse um acordo para ceder a rede lotérica, que é uma rede privada com concessão pública administrada pela Caixa, para que pudessem vender os jogos.

No comunicado assinado em conjunto, as empresas disseram que o contrato de distribuição com a Caixa para ceder as lotéricas na comercialização dos bilhetes era essencial para o sucesso do negócio. “Os 13 mil lotéricos da rede Caixa são fundamentais para o sucesso do lançamento do negócio de bilhetes instantâneos no Brasil e sem essa rede de distribuição as empresas não estavam preparadas para seguir adiante”, informaram.

Outro motivo para abandonar o negócio foi a decisão do Supremo Tribunal Federal, do dia 30 de maio - a Corte definiu que a exploração das loterias não é exclusividade da União, permitindo aos estados e o Distrito Federal o gerenciamento da atividade. O resultado pode abrir concorrência para o consórcio, que desejava explorar, com exclusividade, a loteria instantânea. “Como resultado, e apesar de estar totalmente preparada para cumprir todas as condições financeiras e não financeiras precedentes do contrato de concessão, a gestão prudente de capital determina que nos retiremos do processo e reavaliemos o caso de negócio da implementação de um modelo de operações de loteria no Brasil”, informaram os empresários.

O edital de concessão da Lotex previa que o consórcio poderia fazer acordo de parcerias, inclusive com a Caixa. O uso das lotéricas era apenas uma hipótese e a Caixa não tinha qualquer obrigação de fechar este acordo.

Na avaliação do presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae), Sérgio Takemoto, se a Caixa assinasse o acordo para ceder as lotéricas para comercialização dos jogos, decretaria o fim das loterias. “A Caixa deveria estar no negócio e não ajudar o concorrente a vender os bilhetes na rede que opera. Seria acelerar a morte das próprias loterias”, analisa. “O acordo era vantajoso somente para as empresas – em vez de gastar dinheiro para formar uma rede para comercializar os jogos, usaria o ‘balcão’ da Caixa para lucrar. E a Caixa cederia um espaço em que o próprio banco poderia arrecadar recursos a serem repassados, em parte, para programas sociais do governo. Seria uma insanidade”, explica.

Uma boa notícia é que a desistência das empresas abre caminho para a concessão voltar para Caixa. “É uma possibilidade. A Caixa opera as loterias desde a década de 1960 e arrecada grande percentual para programas sociais. É o que desejamos”, disse.

Os recursos arrecadados pelas loterias da Caixa são fonte importante para o desenvolvimento social do País. Quando operava a Lotex, cerca de 40% da arrecadação era destinada a programas sociais nas áreas de seguridade social, esporte, cultura, segurança pública, educação e saúde. Já com a concessão para o Consórcio Estrela, apenas 16,7% seriam repassados à União.

Só no ano passado, as Loterias da Caixa arrecadaram R$ 16,7 bilhões. Desse valor, cerca de R$ 6,2 bilhões foram transferidos aos programas. Este valor corresponde a um repasse de 37,2% do total arrecadado.

Takemoto lembrou o recente decreto 10.467, assinado pelo presidente Bolsonaro, que entrega para o setor privado a operação de uma nova modalidade de loteria - as apostas de quota fixa. Para o presidente da Fenae, num cenário de concorrência, a Caixa perderia mercado para a nova aposta em conjunto com a loteria instantânea. “Com a atratividade desses jogos, que pagam alto prêmio e repassam praticamente nada para programas sociais, as loterias da Caixa morreriam por inanição. Então, qual seria o interesse da Caixa em ajudar o consórcio que comprou a Lotex?”, questiona. “Em vez de arrecadar para investir em programas sociais, o governo está entregando o lucro das loterias para a iniciativa privada”.

Concessão foi um erro - Para a conselheira de Administração da Caixa (CA/Caixa), Rita Serrano, a concessão da Lotex foi um erro desde sua elaboração. Em 2016, o governo Temer decidiu fazer a concessão privada da operação da loteria instantânea. O Ministério da Fazenda, na época, impediu a Caixa de participar do processo. O banco público poderia, somente, ser parceiro de alguma empresa multinacional. “O que o governo fez não tem cabimento. Se a empresa privada precisa da rede lotérica e usa isso como desculpa para quebrar o contrato, por que a própria Caixa não faz a operação? Ela tem expertise, capacidade e justamente a rede lotérica para operar”, analisa Rita Serrano. “O que não podemos aceitar é que este consórcio estrangeiro faça chantagem por querer usar uma estrutura pronta sem fazer investimentos. Ele aceitou as regras de concessão. É um erro de estratégia do governo anterior e que este atual quer manter - de entregar o patrimônio público para as multinacionais”.

A representante dos empregados no CA/Caixa também analisa as sucessivas tentativas de privatização do governo Temer e de Bolsonaro. “Este é um exemplo claro do que é a privatização e a entrega do patrimônio. O governo quer privatizar, mas a empresa que privatiza quer usar a concessão pública. Ela não quer fazer investimento - quer usar o que já está pronto, a estrutura que já existe, uma rede que já está funcionando”.

Rita lembra que a questão da Lotex nem chegou a ser debatida no Conselho de Administração em 2016, já que o Governo proibiu a Caixa de participar do leilão. Caso o Consórcio Estrela realmente desista do negócio, a conselheira afirma que vai defender o retorno da concessão da loteria instantânea para a Caixa administrar.

Preço de banana - A Lotex, que era operada pela Caixa, foi vendida em outubro de 2019. Depois de sucessivas tentativas do governo em entregar, sem sucesso, o serviço para a iniciativa privada, as empresas International Game Technology (IGT) e Scientific Games International (SGI) arremataram o leilão com um lance de R$ 96,969 milhões para a parcela inicial. Apenas R$ 1 mil acima do valor mínimo estipulado pelo Ministério da Economia e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES). Outros sete pagamentos no valor R$ 103 milhões seriam feitos anualmente, totalizando R$ 817,9 milhões. A concessão valeria por um prazo de 15 anos.

Caixa e Ministério da Economia - A assessoria de comunicação da Fenae procurou a Caixa e o Ministério da Economia para conhecer o posicionamento dos órgãos sobre a desistência da multinacional. A Caixa não comentou sobre o acordo. Já o Ministério da Economia, questionado se as empresas sofrerão alguma penalidade por abandonar o processo, respondeu. “O Consórcio tinha como data limite o dia 21/09/2020 para comprovar, perante o Ministério da Economia, o cumprimento integral das condições prévias à assinatura do contrato de concessão da LOTEX. Entretanto, findo esse prazo, não foram cumpridas diversas condições previstas no edital”, informou.

O Ministério disse, ainda, que está adotando as providências previstas no edital de licitação juntamente com o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES).

Fonte: FENAE

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