Ao invés de gerar emprego e transferir renda, governo quer endividar os mais pobres
PACTU
A liberação do empréstimo consignado para beneficiários do Auxílio Brasil e BPC é eleitoreira, não resolve crise econômica do país e só beneficia banqueiros, dizem secretário da CUT e economista do Dieese
Com 12 milhões de desempregados, 25,6 milhões trabalhando por conta própria e o país de volta ao mapa da fome, com pessoas disputando osso e restos de peixe em açougue, ao invés de ampliar os programas de transferência de renda e investimentos que gerem emprego e renda, o governo de Jair Bolsonaro (PL) amplia as possibilidades de empréstimos para os mais pobres.
O governo decidiu aumentar de 35% para 40% o índice de comprometimento dos benefícios dos aposentados com empréstimos consignados e ainda autorizar que beneficiários do Auxílio Brasil e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) façam esses empréstimos com desconto em folha.
Para secretário da CUT e economista do Dieese, a medida é eleitoreira e foi tomada na hora do desespero, como uma última tentativa para reverter os índices ruins de intenções de voto e a brutal queda de popularidade de Bolsonaro, apontadas por todas as pesquisas que indicam a liderança absoluta do ex-presidente Lula na corrida eleitoral deste ano.
A ampliação do crédito não resolve o problema de emprego e renda, ao contrário, ela é eleitoreira e visa apenas tentar impulsionar a popularidade de Bolsonaro que está em baixa, inclusive entre as pessoas que recebem o Auxílio Brasil, diz o secretário de Administração e Finança da CUT Nacional, Ariovaldo de Camargo.
“Nós da CUT entendemos que qualquer política que possa aliviar as dívidas dos trabalhadores é bem-vinda, mas essa medida vai aumentar o problema de quem já está endividado. A política que deveria ser implementada em invés de acesso ao crédito, precisaria ser a solução do que leva essas pessoas a se endividarem”, afirma Ariovaldo.
O dirigente ressalta que hoje os aposentados sustentam seus filhos desempregados e o aumento do índice de endividamento só maquia os principais problemas do país que são o desemprego e a crise econômica.
A economista e coordenadora do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Patrícia Pelatieri concorda que a medida de Bolsonaro é eleitoreira. Para ela, o presidente está desesperado para colocar dinheiro na economia e, para isso vem tomando medidas como a liberação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e a do dinheiro esquecido nos bancos, entre outras medidas paliativas e decepcionantes - a maioria encontrou centavos nas contas.
“Essas antecipações não são dinheiro novo numa economia devastada como a nossa, são recursos próprios da poupança do trabalhador, seja o aposentado, sejam os mais vulneráveis que recebem benefícios”, critica Pelatieri.
Bancos os favorecidos
Ariovaldo de Camargo não tem dúvidas de que a medida de Bolsonaro favorece os bancos. Segundo ele, muito provavelmente o sistema financeiro vai impor um seguro para não correr o risco de que o tomador do empréstimo tenha o BPC ou o Auxílio Brasil encerrado, antes dele pagar totalmente o empréstimo.
“Hoje os juros dos empréstimos consignados variam de 1,65% a 2,23% mensais. Com uma inflação em média abaixo de 1% ao mês [em 12 meses, inflação medida pelo IPCA-15, passa de dois dígitos], os bancos já saem no lucro, mas para não correrem risco algum vão sobretaxar os juros e os seguros dos empréstimos”, afirma Camargo.
A economista do Dieese também acredita que a liberação desses empréstimos visa garantir mais ganhos aos bancos, que segundo ela, não têm previsão de ter os lucros bilionários do ano passado, quando cinco bancos garantiram em seus cofres R$ 175 bilhões a mais.
“A projeção de lucros dos bancos para este ano dificilmente repetirá 2021 por que a economia está muito combalida, faltam recursos. Essa medida de liberar o consignado é o chamado capitalismo sem risco porque o pagamento do empréstimo já sai de uma conta que vai ter recursos garantidos pelo governo, apesar de um ou outro contratempo, caso haja a interrupção do valor para algum beneficiário dos programas”, explica Patrícia Pelatieri.
Cortesia com chapéu alheio
A outra questão, segundo a economista, é fazer cortesia com chapéu alheio, ao invés de adotar medidas de recomposição da economia, tirando o pouco das pessoas que tiveram perda intensa de renda, empurrando um endividamento de dois, três meses para frente.
“Estamos falando de pessoas estão utilizando cartão de crédito para complementar o que é básico, pra pagar conta de luz, gás, telefone. É uma bola de neve que traz enormes prejuízos à saúde, com problemas psicológicos e distúrbios para quem está endividado”, diz.
"Há uma diferença enorme entre se endividar para comprar casa e carro e se endividar para comprar um botijão de gás" - Patrícia Pelatieri
“Liberar crédito consignado não soluciona o problema, ao contrário. Isto é desespero do governo para parecer que a economia está aquecida, quando não está”, complementa Patrícia.
Metas da equipe econômica
A equipe econômica do governo diz que a liberação do consignado para os mais pobres vai injetar R$ 49 bilhões na economia, sendo R$ 30 bilhões em financiamentos para famílias que recebem o Auxílio Brasil e R$ 19 bilhões para as que recebem BPC.
De acordo com o Ministério do Trabalho e Previdência, o público que pode tomar esses empréstimos chega a mais de 52 milhões de pessoas.
Quem recebe BPC e o Auxílio Brasil
Hoje o BPC, no valor de um salário mínimo (R$ 1.202), é pago a idosos a partir de 65 anos que possuem apenas ¼ do mínimo de rendimentos.
O Auxílio Brasil paga apenas R$ 400 por mês, mas terminará no final deste ano, deixando milhões de brasileiros que antes recebiam o Bolsa Família, criado no governo Lula, sem nada, caso o governo não apresente uma nova proposta de benefício aos mais pobres.
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