O caso MEC e a interferência de Bolsonaro evidenciam corrupção no governo
PACTU
(*) Joel Guedes
A Procuradoria geral da República (PGR) recebeu esta semana um despacho da ministra Cármem Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), com pedido para que o presidente Jair Bolsonaro (PL) seja investigado no inquérito sobre o gabinete paralelo no Ministério da Educação, o tráfico de influência por pastores evangélicos e a cobrança de propina para liberação de verbas do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
Já era ruim a constatação de que os pastores evangélicos Gilmar Santos e Arilton Moura, ambos ligados ao presidente da República, coordenavam um esquema criminoso dentro do Ministério, sob o consentimento do ex-ministro Milton Ribeiro. As denúncias de que os pastores intermediavam livremente a liberação de verbas da Educação para prefeituras, cobrando propina até mesmo em barras de ouro, levaram à demissão do ministro e à prisão do trio, solto menos de 24 horas depois. No entanto, o que deixou o caso muito mais grave foi a conversa telefônica interceptada pela PF, em que o ex-ministro relata à filha que estava ciente da busca e apreensão e que havia obtido a informação numa conversa por telefone com o presidente Bolsonaro. A informação chegou também a Gilmar e Arilton.
Cármem Lúcia classificou como “gravíssima” a interferência do presidente nas investigações. No entanto, o caso precisa primeiro passar pela análise da PGR, porque cabe ao Ministério Público analisar se há indícios para abrir uma investigação. Bolsonaro, que antes colocava a cara no fogo pelo ex-ministro Ribeiro, tenta agora tirar todo o corpo fora. Na propaganda eleitoral, o presidente diz que seu governo não tem corrupção, mas na prática abusa do poder que tem. Inclusive, ao que parece, até mesmo para obter informações sigilosas da Polícia Federal e tentar atrapalhar investigações tão sérias como essa do desvio de recursos da Educação.
Mais uma vez, o discurso anticorrupção se mostra incompatível com as ações do atual governo. A atuação de gabinete paralelo no Ministério da Educação é fato grave, mas não é único. Nesse governo já houve denúncias de corrupção na compra de medicamentos, de vacinas contra a covid-19, de ônibus escolares superfaturados, de tráfico de madeiras na Amazônia, de farra com verbas públicas oriundas do tal “orçamento secreto”. Tudo sem uma investigação séria e boa parte encobertado pela própria Procuradoria Geral da República, a quem cabe, novamente, analisar as denúncias no MEC e autorizar ou não abertura de investigação. Pelo histórico do procurador Augusto Aras, não se pode ficar otimista.
Da Câmara dos Deputados não dá para esperar outra reação que não seja a blindagem do governo. Mais de 100 pedidos de impeachment de Bolsonaro já foram protocolados, mas o presidente da Casa, Arthur Lira (PP), sentou em cima de todos e não abre discussão sobre o assunto. A esperança é a CPI do MEC no Senado, já protocolada, mas atacada veementemente pelos aliados de Bolsonaro. São muitas as evidências e a bancada bolsonarista sabe que basta a CPI puxar um fio para o estrago ser feito.
Uma coisa é certa: nesses quatro anos, Bolsonaro foi o que ele sempre foi na política, parte do baixo clero da Câmara Federal, se esgueirando dos debates mais importantes para o Brasil. Nas raras aparições públicas como parlamentar, sempre passou a imagem de um político falastrão, arrogante e de inteligência questionável. Ao chegar à Presidência em 2018, na condição de arauto do combate a corrupção, a máscara caiu rápido. Só não caiu o governo por conta da compra de apoio no Congresso e, principalmente, do aparelhamento das instituições de controle e de investigação, que em sua maioria estão impedidas de trabalhar e mostrar à população o que realmente se passa no em seu mandato.
No entanto, o pouco que vem à público, mais pela coragem de servidores que enfrentam represálias para cumprir sua função, mostra um final de governo com a cara e o jeito de Bolsonaro: suspeito, melancólico e ineficiente. O que a sociedade brasileira espera é que a Procuradoria Geral da República, a quem cabe abrir a investigação contra Bolsonaro no caso do MEC, cumpra com a sua função. Afinal de contas, a PGR existe para defender os interesses da República e não a cara do presidente.
(*) Joel Guedes é jornalista e editor do Jornal Pactu
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